Eu
tenho medo do pra sempre. O pra sempre é o vilão que insiste em
transformar relações que foram felizes em fracasso diante dos olhos
alheios. Paro e penso quanto tempo dura o pra sempre. Onde fica esse
lugar do qual a gente passa a vida toda falando, a vida toda sonhando.
De fato, nunca conheci alguém que tivesse estado lá.
O pra sempre tem cara de mentira consciente. A gente sabe que não sabe
chegar lá. Tentamos inventar caminhos, usar o GPS, pedir informação. Mas
ninguém sabe informar.
O pra sempre virou quase expressão
automática, que nem o Graças a Deus. A gente fala muitas coisas que não
achamos que sejam obra de Deus – não estávamos exatamente agradecendo,
mas quando vimos saiu. O pra sempre é assim também. Vou te amar pra
sempre. Quero você pra sempre. Sempre que pronuncio uma dessas frases,
meu cérebro alerta para a besteira que acabei de dizer. Não seja
ridícula, ele afirma. Pra sempre é uma coisa distante demais, longe
demais. Porque eu nem sei se vou acordar amanhã. O quadro que enfeita
meu quarto, e que só encaixou em cima da minha cama, pode despencar a
noite e partir minha cabeça em duas. E comigo, vai-se o pra sempre. Ou
eu posso acordar e receber uma ligação sua dizendo que não me ama mais.
Que não sabe o que aconteceu. De repente, acha que meu beijo ficou
molhado demais. Ou que a forma como falo e mexo no cabelo está te dando
nos nervos. E aí vou chorar pitangas no canto, eu e o pra sempre.
E, por isso, tenho que dizer que não te
amo pra sempre. Te amar pra sempre é pesado demais. É responsabilidade
demais. Não sei se aguento o fardo, não sei se dou conta. Não gosto de
meias promessas. Mas posso te oferecer o meu amor de hoje, assim como
fiz com o amor de ontem. Todos os dias quando acordo, penso que sorte
tenho de estar viva. Mais uma noite em que o quadro manteve seu posto de
decoração, invés de se tornar um assassino. E penso também em você. E
penso, como tenho pensado há algumas centenas de dias, que te amo.
Poderia ser diferente. Poderia não amar mais. Mas te amo.
E acho que amor seja que nem um carro –
precisa de combustível pra funcionar. Se você não abastece, ele te deixa
na mão em meio à Marginal às 6 da tarde, enquanto você ia pra aquela
reunião importante. E não adianta xingar os quatro cantos, achar que a
vida é injusta, que nada dá certo pra você. Você não colocou
combustível. Menosprezou as necessidades do carro, assim como
menosprezamos as necessidades do amor. Amor precisa de alimento. Não
ache que ele dura pra sempre se você não cuidar. Amar dá trabalho mesmo.
É que nem cachorro. Dá um trabalho enorme, mas você automaticamente
esquece dos xixis no sofá ou do tapete rasgado quando ele te olha nos
olhos e te tasca uma lambida. Aí você tem certeza que valeu a pena.
A gente combinou que não mentiria para o
outro. E eu não posso te dizer que vou te amar pra sempre. Estaria
quebrando o contrato. E não quero te ouvir dizer que me quer pra sempre.
Não gosto de identificar uma mentira em meio a todo o resto que
considero verdadeiro. Quero sim ouvir eu-te-amo. Muitos deles. Mas
preciso ter a certeza que cada vez que um eu-te-amo sai da sua boca foi
porque, naquele exato momento, você está me amando muito. Porque cada
eu-te-amo que solto, vem naqueles momentos em que o amor é tão grande,
que não cabe dentro de mim. Não cabe também dentro dos beijos. Nem dos
carinhos no seu cabelo. Nem daquela pegada no seu pau. E aí ele pula pra
fora, verdadeiro e explosivo.
E, nesses momentos em que te amo demais,
me dá uma vontade imensa de dizer que te amo pra sempre. Que vou amar
pra sempre aquela conchinha gostosa. Que vou amar pra sempre o jeito
como você me pega com força e me abraça com seus braços grandes. Que vou
amar pra sempre seus conselhos que sempre se provaram coerentes. Que
vou amar pra sempre quando você percebe que eu estou sem sono e faz
aquele carinho infalível na minha nuca, pra eu pegar no sono com você.
Mas me seguro, porque não quero mentir pra mim e nem pra você. Não
consigo imaginar o dia em que não mais amarei cada pedacinho seu. Mas a
experiência me provou que dessa vida, nada sei.
Hoje eu vibro com cada uma dessas coisas
que me fazem te amar. E sei que te amo porque você tem a capacidade de
fazer cada célula do meu corpo vibrar como ninguém mais conseguiu. Mas
não posso te dar o que não possuo – o meu amor futuro. E talvez a
incerteza do sentimento – do meu e do seu – seja justamente o
combustível do meu amor. Sei que amo hoje. E sei que você não me
pertence. Sei que estamos juntos nessa trajetória emocionante da vida
porque assim queremos. E que assim seja enquanto as mãos dadas nos
fizerem felizes.
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